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sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

Produtos têm personalidade ??




Estou lendo "Pleasure with products: Beyond Usability" (2002). A premissa central desse livro é que desenvolvedores se preocuparam demais com o lado intelectual do produto, sua eficiência de uso, e perderam de vista aspectos sensório-motores e emocionais-estéticos. 

Um artigo me chamou a atenção. "The Personalities of Products". Os autores dizem que produtos que vão além da mera usabilidade possuem personalidade. Inclusive chegam a falar de testes psicológicos, como o MBTI, aplicados para decifrar a personalidade de uma cafeteira.

Ok, ok, pode ser apenas uma metáfora. Ainda assim, uma metáfora ruim.


Personalidade é um daqueles conceitos em Psicologia que são bem pouco operacionais. Pouco mesmo. A nível comportamental trata-se de uma simplificação, um modo coloquial de falar superficialmente de comportamentos que geram alguma identidade pessoal. Além disso costuma-se explicar o comportamento de uma pessoa meramente se inferindo a personalidade dela como causa, o que sacia a curiosidade mas impede investigações mais apuradas. 

E se explicarmos a user experience de um produto por sua personalidade, que investigações serão impedidas?


"Oi, sou uma cafeteira. Sou alegre, dinâmica,
um tanto distraída às vezes, e gosto de gatos.
Por isso vendo mais que as cafeteiras de Sagitário"

Em "O Design do Futuro", Donald Norman comenta que não há objetos inteligentes propriamente. A inteligência de um objeto é na verdade a inteligência aplicada de seus projetistas. Se um carro inteligente segue um determinado algoritmo pode-se ter certeza que foi uma pessoa que, de forma inteligente (tomara!) pensou esse algoritmo previamente.

De forma análoga não há produtos com personalidade: o que existe são produtos que expressam valores identitários escolhidos estrategicamente por seus projetistas. Analisar a personalidade de um produto  é apenas compreender de que forma seus projetistas planejaram afetar emocionalmente seu usuários (Espero que tenham pensado nisso).

Ou seja, nem se trata também de analisar a personalidade dos projetistas, mas sim suas decisões projetuais feitas num dado contexto.


Braun: uma marca que muito influenciou a Apple
No artigo, os produtos Braun são classificados como honestos, sérios, brilhantes, estáveis, autoritários(?), conformistas e cínicos(Hã?). Como esse radinho aí do lado. Mas esses são valores planejados por decisores do projeto, não atributos intrínsecos do produto. É a decisão estratégica dos projetistas, que leva em conta diversas contingências de mercado, que deve ser analisada, não uma fantasmal personalidade do produto. Ou seja, a "personalidade" de um produto não é fruto de uma casualidade qualquer que mobiliza misteriosamente emoções nas pessoas, mas  sim algo oriundo de cálculo de seus projetistas (Ou ao menos deveria ser).

Em tempo: o que achei mais interessante de toda essa história de analisar personalidade de produtos foi a possibilidade de checar se o plano estratégico dos projetistas corresponde aos efeitos gerados nos usuários. Por exemplo, objetivou-se inicialmente criar um rádio despojado e divertido. Uma boa pergunta de pesquisa seria: "Os objetivos identitários dos projetistas foram atingidos de fato, gerando tais impressões em quem usou  o produto?"


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